segunda-feira, 11 de julho de 2016

Dinheiro pelo bueiro: Sem fiscalização do DEP, limpeza terceirizada é superfaturada na Capital

ZH acompanhou empresa contratada para limpar equipamentos de drenagem em Porto Alegre e comprovou que serviços informados não foram feitos e acompanhamento da prefeitura é deficiente
Por: Adriana Irion
11/07/2016 - 08h22min | Atualizada em 11/07/2016 - 10h54min
Sem fiscalização do DEP, limpeza terceirizada é superfaturada na Capital Adriana Irion/Agência RBS
Na folha de serviços, empresa JD informou ter limpado 41 equipamentos de drenagem na rua Barão de Teffé. Porém, só existem 14 EDs na rua, segundo cadastro da prefeituraFoto: Adriana Irion / Agência RBS
Às 9h14min de 23 de fevereiro, com pás e picaretas, três homens começavam a limpar bueiros na Rua Barão de Teffé, no bairro Menino Deus, em Porto Alegre. A limpeza de bocas de lobo e de outros equipamentos de drenagem (EDs), instalados nas vias para captar água da chuva e reduzir alagamentos, é um serviço de rotina para empresas contratadas pelo Departamento de Esgotos Pluviais (DEP). Naquela rua, empregados de uma dessas, a JD Construções, fizeram a limpeza de 13 equipamentos.
Dois meses depois, ingressou no sistema do DEP o documento que atesta o trabalho executado e embasa a cobrança. Na folha de medição de serviços foi registrada a limpeza de 41 EDs na Barão de Teffé. Bem mais do que os 13 que Zero Hora viu os funcionários da JD limparem. E também superior aos 14 que o cadastro geral do DEP informa existirem naquela rua.
A conta que não fecha é resultado de uma prática que tem feito dinheiro público escoar para pagar serviços inexistentes. O ágio, documentado por Zero Hora ao observar a equipe da JD Construções naquela manhã, reforça uma suspeita espraiada dentro do próprio departamento: a de que cobranças são superfaturadas e o DEP, sem controlar a execução de serviços, paga.
Durante seis meses de investigação, ZH apurou que há descontrole na fiscalização. Além de acompanhar os serviços nas ruas, a reportagem cruzou informações do cadastro geral da prefeitura — que registra quantos EDs há em cada rua — com dados de pagamentos feitos pelo DEP à JD Construções.
Foi possível verificar que a conta apresentada pela empresa para o município todos os meses traz dados superfaturados, que são aprovados pelo gestor do contrato e pagos integralmente pelo poder público. ZH analisou planilhas de cobrança da JD de 2013, 2014, 2015 e do primeiro trimestre de 2016. A partir delas, selecionou aleatoriamente 31 ruas com dados suspeitos. Em todas foi constatada cobrança superfaturada.
Servidores constrangidos com superfaturamento
Considerando o que foi pago a mais somente pelo serviço de limpeza de EDs, ZH constatou ágio de 18% nessa amostragem de ruas. Foram cobrados 4.111 equipamentos de drenagem que não existem. Se colocados lado a lado, esses 4 mil bueiros preencheriam uma distância de cerca de quatro quilômetros — o equivalente ao percurso entre a Usina do Gasômetro e o Estádio Beira-Rio, pela Avenida Edvaldo Pereira Paiva. Pelo contrato de limpeza de EDs, a JD recebeu R$ 5,5 milhões entre 2011 e maio deste ano, conforme o Portal Transparência da prefeitura. Aplicado o percentual de ágio de 18% sobre esse total, pode-se ter desvio de R$ 990 mil. O valor bancaria a frequência de 182 crianças em escolas de educação infantil durante um ano, por exemplo.
Mais do que este valor, o que deve ser levado em conta é a relação da prefeitura com esta empresa. O montante recebido em contratos com o município desde 2011 foi de R$ 31,7 milhões, segundo dados do site do Tribunal de Contas do Estado.
Confira a investigação completa:

O contrato da JD para a limpeza de bueiros se encerrou em 31 de maio. Apesar de ter feito, ao longo de cinco anos, todas as renovações permitidas por lei, nova licitação não foi preparada a tempo. Conforme o DEP, o contrato está sendo aditado por mais seis meses até que nova licitação seja concluída.
As desconfianças em torno de superfaturamento em cobranças chegaram a ZH a partir do próprio DEP. O cenário de desvio de recursos causa constrangimento a servidores, que constatam cobrança com ágio, mas calam por temer represálias. Ao mergulhar nessa verificação, conferindo o trabalho de empresas contratadas pelo DEP, a reportagem esbarrou em casos que revelam outra faceta da falta de controle: a má qualidade de serviços pagos. São situações que envolvem, por exemplo, trabalhos da Construtora Minosso e da Cootravipa. 


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