Repercussão
Escolas não sabem como se adequar à resolução que beneficia alunos travestis e transexuais
Conselho nacional recomenda que estudantes sejam chamados pelo nome social e utilizem banheiros de acordo com sua identidade de gênero
Travestis e transexuais matriculados em instituições públicas e privadas de ensino conquistaram nesta quinta-feira um importante reconhecimento. Publicada no Diário Oficial da União, a Resolução número 12 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoções dos Direitos de Lésbicas, Gays, Travestis e Transexuais orienta escolas e universidades a garantir o acesso e o reconhecimento desses estudantes em suas dependências.
Entre outras disposições, o texto prevê que eles sejam tratados pelo nome social em listas de chamada e utilizem banheiros e vestiários de acordo com sua identidade de gênero. Na prática, significa que um aluno registrado ao nascer como João possa ser chamado de Mariana em documentos internos de identificação, registro de frequência e avaliação porque se identifica com o sexo feminino e escolheu esse nome social, além de estar autorizado a frequentar livremente as dependências exclusivas para as meninas.
Entidades que militam em defesa da diversidade sexual saudaram a iniciativa, e representantes da área da Educação, apesar de reconhecerem a importância do avanço para a sociedade, ainda não sabem como colocarão em prática as medidas. As recomendações listadas na resolução não têm o peso de lei, mas costumam ser seguidas por serem ditadas por um órgão ligado à Presidência da República e estarem amparadas em preceitos constitucionais.
Secretário-adjunto da Secretaria Estadual da Educação, Luís Antônio Alcoba de Freitas diz que a pasta deve acolher as orientações, mas ainda é preciso analisá-las junto ao setor pedagógico para que se decida a melhor forma de implementá-las nas escolas de todo o Rio Grande do Sul. O tema pode ser incluído na pauta da reunião das Coordenadorias Regionais da Educação, prevista para os dias 19 e 20 deste mês.
– É lógico que a resolução é vista com bons olhos e vamos cumpri-la, mas é preciso ter cautela em relação às crianças. A responsabilidade por elas é dos pais. Não há como inibir a manifestação da criança, mas é preciso ver como operacionalizar isso de maneira que não haja uma repercussão negativa – explica Freitas.
Bruno Eizerik, presidente do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe/RS), compartilha da mesma inquietação, salientando que o documento concede autonomia de decisão para os adolescentes, e lamenta que as escolas não tenham sido convocadas para um debate prévio.
– Temos de trabalhar sempre com a defesa da diversidade, isso não se discute mais. Mas se fala em liberdade, em reconhecer direitos, e se impõe uma regra sem discutir. Como as escolas vão proceder agora? O ano letivo já começou. Como o uso do banheiro vai ser colocado em prática? Teremos quatro banheiros? Dois? Cinco? Passaremos a ter um banheiro só? – questiona Eizerik.
Entre ativistas da causa LGBT, a recepção da notícia foi positiva. Marcelly Malta, presidente da Associação de Travestis e Transexuais do Estado do Rio Grande do Sul _ Igualdade/RS, comemora a concretização de reivindicações antigas. Segundo Marcelly, o uso de toaletes em locais públicos e o reconhecimento pelo nome social são dois dos principais problemas enfrentados por essa população.
– É um dos maiores avanços que tivemos, mas isso já deveria ter acontecido há muitos anos, está vindo tarde. Somos mais de 70 mil travestis no Brasil. As mulheres muitas vezes não querem que uma travesti use o banheiro feminino, olham de uma maneira diferente. Dentro de casa, todo mundo usa o mesmo banheiro: homem, mulher, criança. Qual é o problema de uma travesti usar o banheiro feminino? Mas acredito que vai ter um debate maior agora – acredita Marcelly.
As mudanças previstas
O que recomenda a Resolução 12 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoções dos Direitos de Lésbicas, Gays, Travestis e Transexuais, publicada no Diário Oficial da União desta quinta-feira
– Deve ser garantido pelas instituições e redes de ensino, em todos os níveis e modalidades, o reconhecimento e adoção do nome social aos alunos cujo nome civil não reflita adequadamente sua identidade de gênero, mediante solicitação do interessado.
– O campo "nome social" deve ser inserido em formulários e sistemas de informação utilizados nos procedimentos de seleção, inscrição, matrícula, registro de frequência, avaliação e similares. Registros administrativos farão a vinculação entre o nome social e a identificação civil.
– Recomenda-se a utilização do nome civil para a emissão de documentos oficiais, garantindo concomitantemente, com igual ou maior destaque, a referência ao nome social.
– Deve ser garantido o uso de banheiros, vestiários e demais espaços segregados por gênero, quando houver, de acordo com a identidade de gênero de cada um.
– Casos existam distinções quanto ao uso de uniformes, o aluno pode escolher vestimentas conforme sua identidade de gênero de cada sujeito.
– A garantia do reconhecimento da identidade de gênero deve ser estendida também a estudantes adolescentes, sem que seja obrigatória a autorização do responsável.
– As orientações se aplicam, também, aos processos de acesso às instituições e sistemas de ensino, tais como concursos, inscrições, entre outros, tanto para as atividades de ensino regular ofertadas continuamente quanto para atividades eventuais.
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