domingo, 5 de abril de 2015

Menina nasce para tentar curar irmã de doença grave

Primeiro caso da América Latina, Maria Clara foi embrião compatível para o transplante de medula na irmã Maria Clara, que tinha grave doença.FACEBOOK

Maria Vitória e Maria Clara. Basta ficar só um pouquinho com as duas irmãs para a gente se encantar.
Fantástico: Do que vocês gostam de brincar?

Maria Vitória, 8 anos: De supermercado a gente brinca. De mamãe-filhinha.

Uma tem 8 anos. A outra, 3.
As duas meninas fazem parte de uma história muito sofrida. O drama da Maria Vitória começou quando ela ainda era um bebê de 5 meses de idade.
“Ela começou a apresentar febre, aí o hemograma deu que ela estava com muita anemia, o médico resolveu interná-la. Uns dias depois saiu o resultado do exame dizendo que ela tinha talassemia major e ela acabou fazendo a primeira transfusão dela dentro do hospital, com 5 meses”, conta Jênyce da Cunha, mãe das meninas.
A talassemia major é uma doença genética grave no sangue. A menina tinha que fazer transfusões frequentes.
“Você imagina isso para uma criança, extremamente complicado. E para o resto da vida. Levando em consideração que um adulto pode ter essa frequência a cada dez dias”, explica o médico geneticista Ciro Martinhago.
Eduardo da Cunha: Aí a gente falou: ‘meu, não vou deixar ela viver com isso’.

Jênyce da Cunha: Está emotivo, hein?
Eduardo da Cunha: Bastante. Ah, muita coisa. Volta um monte de coisa na cabeça.

Só um transplante de medula poderia curar a criança. E é aí que a fofura da Maria Clara entra na história. Eduardo e Jênyce decidiram ter outro filho. E pensaram: por que não tentar um bebê sem a doença, e que ainda pudesse ser doador em um transplante de medula óssea para Maria Vitória?
“Nós selecionamos em laboratório, através da fertilização in vitro. E em 24 horas, eu disse para a clínica de fertilização quais embriões eram normais perante à doença. E desses normais quais eram compatíveis paro transplante de medula da irmãzinha”, conta Ciro Martinhago.
Mas não foi só selecionar os embriões sem a doença, escolher o compatível para o transplante, fazer a fertilização e pronto. Existe um drama ético nesse processo todo.
“Tais testes genéticos só devem ser feitos com a precisa indicação de se evitar enfermidades graves. Jamais para atender um eventual capricho dos pais. Por exemplo, cor dos olhos, cabelo, compleição física e até mesmo outros atributos”, explica o fundador da Sociedade Brasileira de Bioética Carlos Vital.
“Essa criança que vai nascer pode se sentir usada. Então, o casal precisa ser preparado psicologicamente para que isso não aconteça”, diz o médico geneticista.


Maria Clara foi o primeiro bebê da América Latina selecionado geneticamente para tentar ajudar na cura de um irmão. Em 2013, um ano depois do nascimento da Maria Clara, foi feito o transplante de medula para a irmã mais velha.

“Todo mundo acha que é medula espinhal. Então, não tem nada a ver com a medula espinhal. Quer dizer, a medula óssea são células. Essas células estão presentes em todos os ossos do corpo. Só que como é mais fácil, a gente colhe as células da bacia, que é um osso grande de fácil acesso. Então essas células são colhidas e são transplantadas”, diz o médico responsável pelo transplante, Vanderson Rocha.
Maria Vitória também passou por sessões de quimioterapia, para destruir as células doentes.
Fantástico: Como que foi o dia do transplante?

Jênyce da Cunha: Ah, o dia do transplante foi um dia muito emocionante pra mim porque foi a conclusão da primeira parte da conquista da Maria Vitória.

Eduardo da Cunha: E eu tinha uma avó, que ela me criou pra vida inteira. E ela faleceu no dia que a Maria Vitória recebeu...

Fantástico: O sangue.
Eduardo da Cunha: Ela faleceu exatamente no dia.
Jênyce da Cunha: E a Maria Vitória estava revivendo naquele momento.

E agora, dois anos depois do transplante, chegou o momento tão esperado por todos: a hora de saber se todo esse esforço valeu a pena.
“Ela está super bem, não tem nenhuma evidência de complicações do transplante. Dá para dizer que ela tá curada”, diz Vanderson Rocha.
“Graças a Deus, ela tá curada. Isso não tem nada mais importante. Nada”, diz o pai das meninas.
Fantástico: Deu um pouquinho do seu sangue pra sua irmã?

Maria Clara: Sim. Que é pra ela sarar.
Fantástico: Pra ela sarar, né? E ela sarou?
Maria Clara: Sim.
Fantástico: O que que você acha disso?
Maria Vitória: Ah, legal. Eu acho legal. É melhor do que ser qualquer pessoa.

“Ela foi muito forte e ela contribuiu demais pra cura dela. Demais, demais, demais”, conta Jênyce da Cunha, mãe das meninas.
Mostramos para esta família tão guerreira uma reportagem do Jornal Nacional feita na época do nascimento da Maria Clara.
Maria Clara: Eu era pequenininha.

Jênyce da Cunha: Ai, que linda!
Maria Clara: E eu estava no colo da Ma.
Jênyce da Cunha: É!

Fantástico: E como que é agora essa sensação de missão cumprida?

Eduardo da Cunha: Não é nem que se tivesse tirado um peso. É Missão cumprida mesmo.

Jênyce da Cunha: Tem pessoas que desistem no começo, no meio do caminho. Tem que ir até o fim. Você pode sofrer, sorrir, chorar. Uma hora a gente consegue, não pode desistir.

Fantástico: Foi longa?
Jênyce da Cunha: Foi longa. Foi sofrida? Foi sofrida. Mas olha a minha filha. Linda. Curada. Não tem preço que pague isso.

G1 - Fantástico.

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